sábado, 8 de setembro de 2012

A cobardia (e a iliteracia económica) como modo de ser

Passos voltou hoje a revelar toda a sua cobardia política. A decisão de ontem foi a forma que o governo arranjou de implementar a sua visão para a competitividade do país, i.e. redução salarial. O tal primeiro ministro que quer transformar estruturalmente a economia nacional e democratizar o país não tem outra ideia para o país que não a via Bangladesh para a competitividade. O homem que começou o discurso de ontem prometendo franqueza, usou a decisão do Tribunal Constitucional como pretexto para uma opção que nada tem que ver com o debate em torno dos cortes dos subsídio de férias e natal dos funcionários públicos e dos pensionistas.
No mundo em que vive Passos, reduzir os custos salariais das empresas (de todas - grandes, pequenas, exportadoras, não-exportadoras) vai melhorar a tesouraria, promover a criação de emprego e dinamizar as exportações. Como é evidente, isto é só verdade num mundo ceteris paribus e outras fantasias de alguma 'ciência' económica. Se é verdade que as empresas ganham em redução de custos, não é menos verdade que perdem em procura e vendas, porque esta medida deprime, ainda mais, a procura interna e o consumo. No mundo em que vivemos, o efeito na tesouraria é necessariamente indeterminado. Também não se percebe em que medida é que as empresas irão contratar mais trabalhadores, porque a procura, que é o que determina as necessidades de emprego, ou fica igual (empresas exportadoras) ou cai (empresas que produzem para o mercado interno). A ideia do aumento da competitividade das exportações também não tem grande sustentação: não só não é líquido que as empresas tenham margem para baixar muito os preços do que produzem (custos laborais são cerca de 13% dos seus custos totais), como, mesmo que os baixassem, está por provar que isso se traduziria em aumento das exportações. A coisa torna-se ainda mais grave quando percebemos que esta estratégia de compressão salarial está em curso em toda a Europa, o que anula quaisquer hipotéticos ganhos de competitividade (a competitividade é um conceito relativo, não absoluto). Apresentar esta medida como um estimulo ao emprego e um reforço da competitividade é a prova da iliteracia económica de quem nos governa.

João Galamba
in Jugular, 08/09/2012
Intervenção na A.R..